sexta-feira, 30 de maio de 2014

Pensamento 46 - AS FACHADAS


"Você não conhece as pessoas, você conhece a parte que elas permitem que você veja."

Verdade! Ou seja, nas relações interpessoais, em particular, nas relações superficiais, no início dos namoros, no início das amizades, o que nós temos, são partes da personalidade do outro, habitualmente o melhor que quer demonstrar de si próprio. 
A pessoa pode estar a ser verdadeira (um eu verdadeiro) - o seu comportamento corresponde ao modo como se sente - , ou pelo contrário, revelar um falso eu.
Nesses primeiros encontros, temos contato com o seu pensamento e com as suas emoções e não tanto com os seus sentimentos para connosco, porque estes ainda estão a se formar, se é que alguma vez se vão formar e criar um elo espiritual que nos possa unir.
Só com o evoluir da relação, o "entrar no jogo", através da nossa capacidade de auto-conhecimento e do conhecimento do outro, nos diversos contextos,  poderemos avaliar o que o outro é, como pessoa, na realidade. Por vezes é preciso contudo, uma vida para conhecê-lo..
Não confundir as emoções, na fase inicial das relações, com sentimentos. 
Não confundir as manifestações comportamentais (o entusiasmo, o prestar atenção...), com sentimentos. 


António Damásio explica a diferença entre EMOÇÃO e SENTIMENTO:

"Você pode- me ver a estar a ter uma emoção, não vê tudo, mas vê uma parte. Pode ver o que se passa na minha cara, a pele pode mudar, os movimentos que eu faço etc., enquanto o sentimento você não pode ver.

O sentimento que eu tenho, você não sabe se eu tenho ou não tenho. E se você tiver um sentimento de profunda tristeza, mas se me quiser enganar, e quiser comportar-se como se estivesse alegre, vai me enganar o mesmo porque eu não posso saber o que está dentro da sua cabeça, posso adivinhar, mas é diferente. "

ANTÓNIO DAMÁSIO - neurocientista português -  em ENTREVISTA, no meu outro blogue: Incalculável -Imperfeição


PERSPETIVAS SAUDÁVEIS SOBRE AS EMOÇÕES 



António Damásio -A relevância da Neurociência Afectiva e Social na Educação

"A relevância da Neurociência Afectiva e Social na Educação (....) os aspectos de cognição que são intrinsecamente trabalhados nas escolas, nomeadamente, a aprendizagem, atenção, memória, tomada de decisão e o funcionamento social, são profundamente afectados pelos processos de emoção, a que chamamos o pensamento emocional. Qualquer professor competente reconhece que as emoções e sentimentos afectam os estudantes no seu desempenho e aprendizagem, assim como o estado do corpo, ou seja, é tão importante como se os estudantes dormiram e comeram bem ou se se sentem mal ou bem. Afirmamos, no entanto, que a relação entre a aprendizagem, emoção e estado do corpo é mais profunda do que muitos educadores pressupõem. Não é que as emoções ditem a nossa cognição, nem que o pensamento racional não exista. A finalidade original da evolução do nosso cérebro é a de gerir a nossa fisiologia, optimizar a nossa sobrevivência, o que nos permite prosperar. Porque é que um estudante resolve um problema de matemática por exemplo? As razões vão desde a intrínseca recompensa por ter encontrado a solução, para conseguir uma boa nota, para evitar a punição, para ajudar um amigo, para entrar numa boa faculdade, para agradar os seus pais ou o professor. Todas estas razões têm uma forte componente emocional e dizem respeito tanto às sensações de prazer como às de sobrevivência, na nossa cultura. Embora a noção de sobrevivência e desenvolvimento seja interpretada num quadro cultural e social nesta avançada etapa da evolução, o nosso cérebro continua ainda a evidenciar o seu propósito original: gerir os nossos corpos e mentes ao serviço de viver, e viver felizes, no mundo, juntamente com as outras pessoas.” 

ANTÓNIO DAMÁSIO - Neurocientista português

terça-feira, 27 de maio de 2014

LIVRO Parentalidade Positiva


Parentalidade Positiva
 AQUI ou AQUI


É um livro digital do Centro de Estudos Para a Intervenção social (CESIS) – Projeto Espiral (CLDS)
Autores: João esteves (psicólogo); Ana Paula silva (assistente social)
Set 2012

As dinâmicas de grupo versam as temáticas:
  • Comunicar
  • Regras e limites
  • Elogiar
  • A importância de contar Histórias às crianças e estratégias para criar histórias
  • Histórias

segunda-feira, 26 de maio de 2014

TVL - Programa “Viagem Pelo Cérebro”



Poderá aceder a ENTREVISTAS em vídeos sobre as temáticas:
  • A Hiperatividade – com Manuel Domingos
  • Sobredotação – com Helena Serra
  • Emoções e aprendizagem - com Ema Fontes
  • Consciência fonológica – com Marta  Gameiro
  • Psicomotricidade – com Rafael Pereira
  • Distúrbio do Processamento Auditivo Central
  • Educação Especial - com Inês Salgado Rodrigues
  • Dislexia – com Ema Fontes; Margarida Loureiro; Paula Loureiro
  •  ....
  • ...

quarta-feira, 21 de maio de 2014

APAV para jovens



Associação de Apoio à Vítima para Jovens (APAV para jovens)
Trata-se de um website com informação sobre diferentes formas de violência, estratégias de segurança e de procura de ajuda, competências para a resolução de conflitos e outros desafios sociais.
Ao acederes encontras informação sobre:
  • violência doméstica; 
  • violência no namoro;
  • bullying;
  • violência online; 
  • segurança na rua; 
  • segurança na internet; 
  • violência sexual;
  • segurança em ambientes de diversão; 
  • testemunhar em tribunal; 
  • segurança na escola.

O projeto LEAD - inform to prevent envolve este website, e as seguintes ações: 
- campanha publicitária de sensibilização e informação, que sensibilize estas populações para a procura de ajuda em caso de experiências pessoais de violência e informe sobre comportamentos pessoais promotores da segurança;
- agenda escolar com informação sobre diferentes formas de violência, estratégias de prevenção, de segurança pessoal, de procura de ajuda e de resolução de conflitos e outros problemas sociais.


domingo, 18 de maio de 2014

Programa aprender a ler para aprender a falar



PALAF
Programa: Aprender a ler aprender a falar
Autores: Luisa Cotrim e Teresa Condeço
Versão 2; Julho 2012


Um produto  http://www.nasturtium.com.pt/  (Loja on-line de materiais e Recursos pedagógicos)

O Programa de Promoção das Competências Comunicativas na Idade Precoce, tem como objetivo apoiar a família e os educadores que se ocupam de bébés e crianças com perturbações do desenvolvimento, de forma particular, com defice intelectual e / ou perturbação da linguagem e da comunicação.

sábado, 17 de maio de 2014

Pensamento 45 - WOULD YOU LIKE YOU?


Would you like you, if you met you?

Gostaria de si, se se encontrasse consigo próprio? O nosso crescimento deve seguir esse sentido: gostarmos da pessoa que nos estamos a tornar, e como tal, gostariamos de a conhecer, se tal fosse possível. 

Susana Jeffers* afirma o mesmo: "Você tem de se tornar aquilo que quer atrair. Ser o gênero de pessoa que gostaria de estar rodeado."

*Apesar do medo

TENHA um ÓTIMO DOMINGO

terça-feira, 13 de maio de 2014

ENTREVISTA a Eric Debarbieux sobre o combate ao bullying


Especialista francês defende que duas condições são essenciais para que as escolas lidem com problemas como o bullying: a estabilidade do corpo docente e a construção de um bom clima
Entrevista de Lúcia Müzell da Nova Escola

A violência nas escolas só pode ser enfrentada se tratada em profundidade, com formação docente específica, incentivo à solidariedade e aumento da proximidade entre professores e alunos. Essa é a avaliação do especialista francês Eric Debarbieux, autor do primeiro plano nacional de combate ao bullying nas escolas da França. Câmeras de vídeo? Detectores de metais? "São inúteis", de acordo com o autor de obras como Violência na Escola: Um Desafio Mundial e Os Dez Mandamentos Contra a Violência na Escola. Há sete anos Debarbieux dirige o Observatório Internacional da Violência nas Escolas, em Bordeaux, cargo que ocupou após realizar uma ampla pesquisa no Brasil, onde foi diretor de Pesquisa e Avaliação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). A experiência, realizada com 11,5 mil estudantes, lhe permitiu traçar um perfil do problema nas escolas brasileiras. 

Que tipo de atos se enquadram no termo violência escolar?

Eric Debarbieux: Fatos mais marcantes, como o massacre do Realengo (episódio em que um ex-aluno entrou armado em uma escola municipal do Rio de Janeiro em abril de 2011 e matou a tiros 12 estudantes), mas principalmente as violências cotidianas que têm como característica a repetição. No mundo inteiro, um grande número de alunos sofre com ações desse tipo diariamente. E elas podem ser banais, como receber um apelido maldoso ou sofrer pequenos empurrões. As pesquisas apontam que, embora sejam atos relativamente simples, envolvendo alunos ou professores, o fato de eles se repetirem à exaustão é grave. A violência explícita, com agressões físicas ou mortes, é muito excepcional e infelizmente difícil de neutralizar porque constitui crimes como outros quaisquer.

É possível determinar as causas desse problema?

Debarbieux: Elas são múltiplas e determinadas pela soma de certo número de fatores de risco presentes no cotidiano dos envolvidos. Um deles é o pessoal, ligado ao temperamento de cada um, mas também influenciado pelas relações familiares e pelo meio social. Outro elemento importante é o ambiente da escola. Por exemplo, a estabilidade da equipe docente e a clareza das regras escolares são aspectos determinantes para que se alcance a proteção almejada. Na França, identificamos que as escolas mais problemáticas são aquelas que têm o corpo docente mais instável. Sem um grupo perene e que conviva de forma sadia, é difícil fazer algo contra a violência escolar. É uma questão de solidariedade e de exposição ao risco: você fica menos exposto quando integra um grupo que seja solidário. 

O professor, de modo geral, é um profissional preparado para lidar com a violência na escola? 

Debarbieux: Esse é um dos pontos essenciais a debater. Na maioria dos países, faltam docentes capacitados para enfrentar essa situação difícil. Fico impressionado com o fato de que os professores passem a vida trabalhando como líderes, tendo que manter o controle da classe, sem receber nenhuma formação específica para isso. É inacreditável, inclusive, porque as violências escolares surgem quase sempre dentro dos grupos de estudantes. 

O tipo de violência escolar mais popular no mundo hoje é o bullying?

Debarbieux Certamente. De acordo com nossas estimativas, a média mundial de alunos atingidos pelo problema fica entre 7 e 15%. Os graus de violência são diferentes. Segundo um grande estudo que fiz no Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), na França, cerca de 11% dos estudantes sofrem bullying, e 5% deles de uma forma severa. 

A solução está na gestão da escola?

Debarbieux Sim. O modo como uma escola é gerenciada e a atenção que os adultos dão aobullying têm um grande impacto sobre os efeitos dessa violência. Sabe-se que há uma ligação muito forte entre a qualidade do clima e das relações pessoais na escola e a ocorrência de casos desse tipo. 


Existem países em que o bullying não se manifesta na escola?

Debarbieux Não. Entretanto os casos nos países do norte da Europa diminuíram em mais da metade em relação à média europeia desde que os governos assumiram um papel-chave para lutar contra isso, há mais de 20 anos. O Reino Unido também seguiu a mesma linha de adoção de políticas de prevenção. Mesmo assim, não podemos nos dar o direito de parar de evoluir. O fato de tratarmos violências menores não significa que estejamos lidando com uma coisa pequena e sem importância. As pesquisas mostram que, em termos de atos mais graves, como os que envolvem matanças nos Estados Unidos, 75% dos alunos que foram à escola armados e mataram colegas eram vítimas de bullying.


Como recuperar os envolvidos com o bullying? 

Debarbieux É preciso mostrar ao jovem agressor as consequências do que faz. Frequentemente, trata-se de um garoto inofensivo, que quer se afirmar e, ao se colocar nesse papel, sente-se mais forte que os demais. Por isso também é importante desenvolver a empatia, a capacidade de se colocar no lugar do outro, a conscientização de que esse tipo de situação é prejudicial para todos - e isso não se faz apenas com eventuais lições de moral. A pessoa violenta sempre pensa que a culpa é da vítima. E a simples punição para que isso não se repita não é uma solução, inclusive porque muitas vezes piora o problema e pode até gerar atos de vingança. 

Medidas de segurança e repressão ajudam nesse processo?

Debarbieux Há uma série de providências espetaculares contra o bullying: instalação de câmeras de segurança, reforço do policiamento e implantação de medidas repressivas. Mas nenhuma ação pontual funciona de verdade. O fenômeno precisa ser tratado no longuíssimo prazo e a solução-milagre não existe. Há muitas experiências positivas sobre a justiça restaurativa e punições construtivas. Ao mesmo tempo que precisamos cuidar da vítima e reconstruir a sua identidade, devemos reparar o agressor: não apenas por caridade, mas por necessidade. 


E quanto ao cyberbullying, que na maioria das vezes tem um agressor oculto? 

Debarbieux No cyberbullying, a violência começa no horário das aulas e continua durante o restante do dia e a noite inteira. O aluno recebe uma metralhada de mensagens no celular, em seu e-mail ou nas redes sociais, como o Facebook. É muito difícil quebrar a lógica de que insultar o colega na internet é engraçado. E não há outra solução a não ser intensificar a colaboração existente entre a escola e a família. 


A violência física nas escolas é caso de polícia ou assunto para ser resolvido internamente?

Debarbieux Depende de como se considera a polícia. Se os policiais são simplesmente brutamontes que estão atrás de bandidos, esqueça. É preciso lembrar que a maioria das violências é pequena e não motiva uma intervenção externa. Apenas com repressão, não diminuiremos as taxas de violência, já que o objetivo não é punir culpados, mas evitar que haja vítimas. Por outro lado, se consideramos a polícia uma aliada no trabalho educacional, pode ser extremamente interessante. Quando estive no Brasil, acompanhei a ação extraordinária das brigadas escolares em Brasília. Havia jovens policiais mulheres que mostravam de forma clara o que era a lei. 


Qual sua visão sobre o quadro da violência escolar no Brasil?

Debarbieux A pesquisa da Unesco que fizemos aí foi muito interessante. Ela mostrou que há violência e problemas. Entretanto, se comparamos esses resultados com os de outros países, eles foram bastante favoráveis. Nós pesquisamos alunos de 10 a 16 anos em escolas públicas de todo o país. A forma como eles veem os professores é muito positiva. Não romantizo de forma alguma essa situação. Mas é preciso reconhecer que os professores são muito mais próximos dos alunos do que em outros locais onde talvez eles sejam mais bem formados, mas não conseguem estabelecer essa relação. Em zonas onde a violência faz parte do cotidiano, como na comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro, as escolas se mantinham, dentro do possível, protegidas. Há fatores paternalistas, como o fato de o filho do principal traficante estudar ali. Mas, em geral, no Brasil, a escola é um capital social. Ela faz parte da comunidade e, por isso, consegue se proteger parcialmente do que há de ruim nela. Em São Paulo, por exemplo, há escolas com grades e policiais na entrada, mas elas permanecem de portas abertas para a comunidade participar de atividades. 


Após o caso de Realengo, muito se falou sobre o motivo que levou o agressor a escolher uma escola para atacar. Que aprendizados podemos extrair desse episódio?

Debarbieux Isso é uma prova de que é preciso tratar as pequenas violências do cotidiano para evitar as mais graves. Massacres escolares como esse não acontecem todos os dias. No mundo, deve ter havido talvez uns 30 desde 1960. Não é por isso que vamos colocar detectores de metais, policiais e câmeras em toda escola. Em primeiro lugar, custa absurdamente caro. E, em segundo, já sabemos que seria inútil. Na França, uma reflexão emergiu no ano passado no âmbito político porque, em um estabelecimento considerado um dos mais seguros do país, um aluno morreu esfaqueado por outro. O ministro da Educação então notou que a polícia na porta e as imagens de vídeos não serviram para nada. Percebeu-se que só um trabalho complexo e no longo prazo teria efeitos. Foi a primeira vez que convenci um governo a preparar pessoas para formar os professores a fim de que eles pudessem enfrentar a violência nas escolas. Isso já é um começo.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Pensamento 44 - A QUEM O PSICÓLOGO INCOMODA

A QUEM O PSICÓLOGO INCOMODA?
Incomoda aos pais que acham que devem controlar seus filhos;
Incomoda o patrão que quer um funcionário dócil e obediente;
Incomoda o professor e o diretor da escola que quer um aluno comportado;
Incomoda o médico que quer ser o senhor absoluto da saúde humana;
Incomoda o juiz que quer ser o senhor da vida alheia;
Incomoda o dirigente que acha que conhece todos os assuntos;
Incomoda o religioso intolerante às crenças alheias;
mas, de fato o psicólogo incomoda os que querem controlar a vida das pessoas, 
pois a função do psicólogo é fazer fluir o direito de liberdade, a liberdade de ir e
vir, a liberdade de expressão, a liberdade de ser feliz.
O psicólogo não incomoda os pais que sabem educar, não incomoda a patrão justo, não incomoda o médico ético, não incomoda o juiz conhecedor dos
direitos humanos, não incomoda o dirigente que quer o melhor para os seus
comandos e não incomoda os que respeitam as escolhas alheias.
Os que se incomodam com os psicólogos 
são os que mais precisam deles
RICARDO PORTELA

BOM FIM de SEMANA!

Módulo 1 – Cyberbullying (Segura Net)




ACEDER em
http://seguranet.mooc.dge.mec.pt/modulo-1/  - vídeos e outros recursos, tais como: 

segunda-feira, 5 de maio de 2014

ENTREVISTA a Jorge Ramos do Ó: "As praxes"


Entrevista de Andreia Sanches a Jorge Ramos do Ó, com o título “É como se estivéssemos numa espécie de loucura consentida, a aprender o que há de pior para ser um cidadão”, que saiu no Publico de ontem

Os rituais dos alunos que tanto dão que falar são o espelho de algo muito maior, acredita o historiador Jorge Ramos do Ó, que não foi praxado por colegas quando era estudante. Mas foi “praxado por professores, a vida toda”. Como? “No sentido em que tive de ouvir coisas muito disparatadas e responder a perguntas muito imbecis. Para haver mentalidade praxista, não é preciso haver praxes.”
Jorge Ramos do Ó é professor no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e especialista em História da Educação e Análise do Discurso. Nesta entrevista, defende que o que está enraizado há séculos no sistema educativo é isto: “A ideia de que não existe uma simetria de inteligências. A ideia de que o saber se ouve, não se constrói. A ideia de que não se experimenta, decora-se. A ideia de que não se pensa, reproduz-se.” O sistema educativo é assim. A chamada praxe académica é assim. Os jovens acham que o que os espera quando forem adultos não é diferente. Se querem ser respeitados, terão de sobreviver ao jogo, acreditam.
O professor, autor de livros como A Universidade de Lisboa, da Revolução Liberal à Actualidade (Tinta da China) e O Ensino Liceal (Ministério da Educação), foi uma das três personalidades a quem pedimos para ler e analisar alguns dos muitos testemunhos que recebemos sobre praxe. Diz que se comoveu. “Estamos todos a operar na miséria relacional — as vítimas, os agressores, os que se sentiram excluídos, os que ficam traumatizados, os que se sentem muito felizes com a praxe...”
Os rituais de recepção aos caloiros estão descritos há séculos como tendo uma função disciplinadora positiva [as trupes em Coimbra tinham supostamente a missão de garantir que os estudantes mais novos não saíam à rua à noite e ficavam em casa a estudar]. Também vê estes rituais dessa forma?
 São rituais de disciplina, mas, do meu ponto de vista, são mais rituais que mostram o modo como os jovens adultos, os estudantes universitários mais velhos, procuram mimetizar uma ideia que têm da universidade. E, ao mesmo tempo, uma ideia que eles têm do próprio sistema educativo. Os alunos são aquelas pessoas que estão a ouvir o professor. Podem ouvir professores que dizem disparates, mas estão ali a ouvir. São vistos como alguém que não conhece e que, portanto, alguém que precisa de se dispor a ser submetido por uma coisa qualquer que é o saber, ou a ordem, ou a disciplina.

A minha posição aqui não é a de ser a favor ou contra [a praxe]. É a de constatar esta dinâmica que procura reproduzir a instituição escolar no que ela tem de impossibilitador de uma vida comunitária baseada no acolhimento, na ideia de que duas inteligências se encontram, pensam e experimentam juntas — que é muito a ideia de instituição universitária nos países de tradição alemã ou anglo-saxónica, onde estas praxes têm muito menos significado do que nossa cultura.
E em Portugal?
Nós vimos de uma tradição neurótica, se quiser, que consiste em termos um professor que pode dizer tudo, incluindo os maiores disparates, e haverá sempre alguém que imagina que se se adequar a esses disparates, e sobrevivendo a eles, pode um dia ser um adulto respeitado.

Teve oportunidade de ler excertos de algumas dezenas de textos que recebemos sobre a praxe nos últimos dias...
A primeira coisa que me impressionou, mais do que os relatos, que demonstram formas de humilhação, mais do que aquelas vozes que dizem “tenho muitas saudades [da praxe]”, “gostei muito”, “foi onde fiz os meus melhores amigos”, é que há aqui depoimentos que mostram que as pessoas percebem que para se ser adulto “tem de se fazer sacrifícios”, “que isto é uma preparação para as hierarquias, para a responsabilidade, para o trabalho em equipa”. Não há nada que estes jovens adultos, os estudantes, duxes e etc. façam com os mais novos que não tenham visto — e sentido na pele. E é como se estivéssemos aqui todos numa espécie de loucura consentida a aprender o que há de pior para vir a ser um cidadão. E que é imaginar que tem de se obedecer à autoridade mais ilegítima, mais brutal, mais humilhante.

Mas a hierarquia marcada, a ideia do aluno passivo, é algo que sempre esteve presente no sistema educativo...
Do ponto de vista histórico, tem razão quando diz que sempre existiu. A questão é que agora se absolutizou, atinge a vida juvenil no seu conjunto. Enquanto há 150 anos estávamos a falar de uma parcela da juventude — na universidade estavam pessoas que normalmente eram da classe média —, hoje toda a gente está na universidade. E é tudo mais visível. Para além de que a tolerância para com a vida juvenil também é menor — os alunos aparecem nos jornais, nos media, quase só na medida em que produzem comportamentos idiotas, violentos... não há esforço para mostrar uma imagem menos negativa. Estes fenómenos têm uma existência hoje, uma circulação, que não tinham anos atrás. Toda a gente sabia o que era as praxes, mas, como aquilo estava relativamente circunscrito e fazia parte de uma elite, era visto pelos adultos como alguma coisa que eles próprios já tinham protagonizado, sendo eles parte dessa mesma elite, que assim se via reproduzida. Hoje é mais fácil distanciarem-se disto. E sobretudo, nós, universitários – imagino que alguns, talvez mesmo muitos –, reagimos às praxes como se elas não tivessem nada que ver connosco, como se elas fossem uma coisa da barbárie cultural, própria daqueles que são os recém-chegados, que vemos como estando em ascensão social e nada têm que ver com o nosso mundo e as nossas referências culturais e existenciais. Nós, que estamos ali no mesmo edifício, alguns de nós que abrimos as salas para os alunos mais velhos fazerem as praxes aos alunos mais novos, imaginamos que o que eles façam de horror não tem nada que ver com o que nós fazemos.

É um bocadinho esquizofrénico, isso de abrir as portas das salas se é uma barbaridade…
Quem faz as praxes — mesmo os nomes: o doutor, o engenheiro, a besta, toda essa nomenclatura — quem produz as praxes está, de alguma maneira, a reproduzir designações que são as do próprio mundo universitário.

O que é que na forma de relacionamento numa universidade pode haver de semelhante com a praxe?
A ideia de que alguém tem tudo a ensinar e alguém tem tudo a aprender. A ideia de que não existe uma simetria de inteligências. A ideia de que o saber se ouve, não se constrói. A ideia de que não se experimenta, decora-se. A ideia que não se pensa, reproduz-se. Isto está enraizado no nosso sistema de ensino há séculos. E na actualidade. É esta encenação que os jovens fazem nas praxes. E que é a expressão da forma de poder mais violenta e mais omnipotente, que é você dizer assim: “Eu vou produzir um escravo feliz, vou escravizar, vou humilhar, vou pôr em causa valores da intimidade mas no fim, se a pessoa sobrevive àquilo, ela vai considerar-se uma vencedora.” É como se reduzisse a vida comunitária a esta ideia de que você pode ser escravo e senhor, não pode ser outra coisa. E esta é a grande fantasia do poder na sociedade moderna.

Qual?
Produzir escravos felizes, produzir o máximo de disciplina consentida, o máximo de obediência, responder a ordens contraditórias — “Fala! Está calado! [in relato de uma das alunas que enviaram o seu testemunho ao PÚBLICO]” O que há de mais repugnante é isto estar dentro da nossa vida. Não é um cogumelo que nasceu ali no meio do nada.

Para mim, o pior é que não há alternativa: a não ser a miséria de querer reproduzir os partidos políticos, ou de pertencer à Maçonaria, não há, do ponto de vista daquilo que é a missão da universidade — que é produzir conhecimento, a fantasia do conhecimento, a fantasia da ciência, de que tudo pode ser pensado —, não há formas de vida comunitária alternativas às da praxe. Se quer pensar, em grupo, novas formas de conhecimento e de vida, associando-os, fazendo com que se alimentem um à outra, o que é que você tem? Nada. Era bom que olhássemos para isto das praxes como uma exigência a nós próprios para inventarmos formas totalmente novas de estarmos juntos.
A tragédia é imaginarmos que podemos estar dentro de uma instituição que foi criada para ser autónoma de todos os poderes — e desde a Idade Média, desde o seu aparecimento, se construiu como espaço de autonomia, para pensar sobre tudo e pôr tudo em causa, imaginar que não há nenhuma pergunta que não possa ser feita — e, depois, produzimos uma vida lá dentro que reduz esse princípio a algo que é o contrário, que é: “Você não pensa, você é burro, é idiota.” Este praxante encarna ele mesmo essa figura, é alguém que teve muitas matrículas, que não conseguiu ter sucesso na parte académica mas por isso mesmo pode administrar, como se conhecesse, dentro de si próprio, e de uma ponta à outra, a linguagem do poder... Submete como foi submetido.
As pessoas que nos escreveram falam muito sobre a divergência de percepções sobre o que num determinado ritual é ou não violento. Para o reitor, uma praxe violenta é uma coisa; para o aluno, é outra; para um professor A ou B, é outra; para o secretário de Estado, é outra...
Se para as pessoas é uma questão de grau — alguém ter uma orelhas de burro não é violento, mas se o despirem com as orelhas de burro já é violento —, para mim, o princípio é sempre o mesmo princípio e é o princípio que eu condeno: a ideia de que alguém tem tudo a dizer e alguém tem tudo a aprender. Eu acho que tudo o que sejam formas de relação que não suponham um bom encontro, uma afectação positiva, marcada pelo desejo de pensar sobre o amanhã do conhecimento e sobretudo que não inscrevam o desejo do saber no centro da vida universitária, são no mínimo inúteis, para não dizer mesmo desprezíveis.

Compreendo que alguém tenha prazer em humilhar, em ter alguém à mercê e de a submeter e depois de a libertar — é uma coisa um bocado erótica. Agora, o que eu digo é que, provavelmente, essa prática é mais tolerada na instituição escolar do que em qualquer outra.
Como assim?
Num hospital, numa prisão, estes comportamentos seriam, provavelmente, mais facilmente denunciados e se não são denunciados — e é preciso que morram pessoas para se debater isto — é porque, provavelmente, uma vez mais, as universidades não querem constatar que os mais jovens estão a copiar comportamentos dos adultos. Porque aí a conversa não é sobre os mais jovens, é sobre nós todos. Por que é que nós somos tão permeáveis à vertigem totalitária?

Desta conversa pode ficar a ideia de que não compreendo estas pessoas que entram neste jogo. Eu queria dizer que compreendo. Não tenho nenhuma espécie de identificação com as praxes, mas compreendo e vejo isto como uma caricatura da vida adulta. E para mim, o trágico, é que os adultos apresentem deles uma imagem que só pode ser reproduzida nesta relação pobre. É como se estivessem num devir adulto, a tentar sistematizar, a tentar representar de forma metafórica, simbólica, aquilo que é o movimento para ser adulto.

Há algum depoimento que o tenha tocado mais?
“Acordamos para a vida que nos espera lá fora”, “isto faz-nos crescer enquanto cidadãos”, “não tem um adulto que fazer sacrifícios?”, “estão a preparar-nos para trabalhar em equipa” — é o que dizem estas pessoas. Também dizem que representaram “o papel de bestas ignorantes que não sabem as respostas”, que lhes raparam o cabelo, que estiveram em “posições absurdas”, que há “um tribunal da praxe”... Isto é um facto social total, ocorre em todas as universidades, mais numas, menos noutras, mas é um facto da vida universitária contemporânea que as pessoas que chegam ao vértice do sistema de ensino, seja enquanto alunos universitários, seja enquanto professores, vivem nas suas instituições práticas de aniquilamento, de integração que supõem esta obediência consentida. E se isto acontece é porque se sabe que há um ganho qualquer. Que se está a jogar uma fantasia de poder que é o poder hierárquico.

Onde é que se licenciou?
Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas [da Universidade Nova de Lisboa], na década de 80. Havia praxes, poucas. Participei numa coisa dessas, como praxante: um dia demos uma aula com uma bibliografia em alemão ou chinês...

Era um falso professor.
Éramos falsos professores. Senti-me ridículo ao fim de meia hora. E nunca mais fiz nada.

E praxado, foi?
Não pelos meus colegas, mas fui muito praxado por professores, a vida toda. No sentido em que tive de ouvir coisas muito disparatadas e responder a perguntas muito imbecis. Para haver mentalidade praxista, não é preciso haver praxes.

Devo dizer que li isto [os testemunhos dos leitores do PÚBLICO] com uma certa emoção, se quer que lhe diga. Se eu tivesse que me identificar aqui com alguém, e se eu tivesse de ser solidário, seria com as pessoas que foram vítimas mas também com as pessoas que dizem que isto foi como voltar a ser criança... para mim, é tudo a mesma coisa.

São todos vítimas?
Estamos todos a operar na miséria relacional — as vítimas, os agressores, os que se sentiram excluídos, os que ficam traumatizados, os que se sentem muito felizes com a praxe...



FIM
MUITO BEM DITO!

Vídeo "temos o direito de ser humilhados"  É desta miséria humana que se falou:






PORTAL Com.Emprego em Moçambique


Seguem-se Brasil e Timor-Leste.
O mais recente portal lusófono de emprego e formação,Com.Emprego, acaba de adotar o domínio moçambicano, no novo endereço http://www.comemprego.co.mz/portal/, destinado à comunidade deste país.
O portal lusófono com ofertas de emprego e formação de qualquer entidade empregadora ou formadora de Portugal e Moçambique tem planos para se alargar ao Brasil, Timor-Leste e ainda aos PALOP.
Além de ofertas de emprego e formação, o portal Com.Emprego é ainda um local de divulgação de notícias e de eventos, diariamente.
Fonte: dinheiro vivo


sábado, 3 de maio de 2014

Violência Escolar - prevenir, detectar e intervir


(AQUI) ou (aqui)

Título: Violência Escolar - prevenir, detectar e intervir
Autor: Teresa Magalhães
Edição EAPN - Rede Europeia Anti-Pobreza / Portugal 
Edição 2010

Destinado a Assistentes Operacionais das escolas

GUIA - Pobreza e exclusão social



Pobreza e Exclusão Social - Um guia para professores
Edição: Rede Europeia Anti-Pobreza/Portugal (EAPN)
2009

Pensamento 43 - SER POSITIVO


Seja diferente: Não derrube. Ajude a levantar

Isabel Abecasis Empis* (psicanalista) afirma o mesmo:
“Precisar de denegrir o outro para simplesmente nos definirmos como sendo o “não ele”, sem conseguirmos anunciar a essência original do nosso projeto, é infelizmente tentação e prática corrente. São, neste caso, palavras que servem a agressão e a esterilidade.” 

in, Bem – aventurados os que ousam A paixão de viver Oficina do livro


BOM FIM de SEMANA!

Educação e forças de caráter

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Felicidade Pública: manifesto contra a instrumentalização da felicidade laboral


"Artigo de Helena Marujo, psicóloga professora universitária no ISCSP/UL, que saiu no Jornal Publico de 23.4.2014, com o título: "Felicidade Pública (9): manifesto contra a instrumentalização da felicidade laboral": 

That is happiness, to be dissolved into something complete and great”(Isso é a felicidade, a ser dissolvida em algo completo e grandioso), Willa CatherMea culpa.

Tendo sido uma das primeiras pessoas que começou em Portugal a falar da importância da felicidade no contexto laboral,  sinto-me inquieta com o rumo que pode trazer a bandeira de uma abordagem positiva nas organizações em tempo de desertos.  
Guiava-me na altura a vontade de criar lugares de vida mais humanos, de pensar em formas sociais democráticas mais límpidas e evoluídas, em locais de produção de bens e serviços mais vocacionados ao bem-comum. Queria ver mais, no espírito do próprio tempo, do que outra leva de emigração em busca de dignidade, decência e alimento; queria humildemente ajudar a construir um mapa moral e dialogante nas empresas privadas ou públicas, nas fábricas, nos serviços, nos campos, nas escolas, nos hospitais.
Hoje, vejo o tema da felicidade a entrar nas organizações, e devia sentir-me, no mínimo... feliz. Mas antevejo o risco.
Quantas vezes configurada em não mais do que um rol de práticas assentes num irrefletido e vago sentimento moral, numa superficial alegria, e em mais uma forma de instrumentalização de quem trabalha – um novo caminho para maior produtividade, uma outra forma de medir, controlar  e influenciar a satisfação, uma repetição triste de formas manipuladoras de controlo – a possibilidade da felicidade está ainda mais em perigo.
Quando sonhei trazer da investigação para o dia-a-dia dos empregados esse horizonte da felicidade idealizei formas de trabalho, liderança, comunhão relacional e ambiente laboral com verdadeiro compromisso, porque resultado de justiça interna e equidade externa, uma felicidade tecida em redes de pessoas solidárias, compassivas, íntegras e coerentes, com espaços e tempos de autodeterminação e autonomia, sentindo-se competentes e valorizadas, construtoras de coletivos e não apenas de egoístas individualizações, numa clara expressão de evolução da sabedoria conjunta e de uma gramática mista de hedonismo e sentido. Invoquei locais de trabalho que fossem verdadeiras cartografias de pequenas virtudes diárias, desde o CEO ao segurança, do trabalhador docall center ao educador no infantário.
Nunca concebi uma coexistência que convidasse à uniformidade, ao opressivo e falaciosamente entusiasmado, sempre externamente motivado, e muito menos desejei uma felicidade que fosse descontextualizada.
Soube pela pena de Robert Skidelsky, num artigo deste mês de Abril do The New York Review of Books, que há algum tempo as hospedeiras de bordo de uma companhia de aviação norte-americana tinham ameaçado fazer uma “greve de sorrisos”, em resposta às múltiplas tentativas da entidade patronal para aumentar ao limite a eficácia e rapidez do seu trabalho. E relembrei o taylorismo, as prisões circulares de controlo permanente pensadas por Bentham – os panóticos, ainda hoje identificáveis – e a forma robótica e automatizada como, em consequência hoje, ainda e de novo, concebemos o trabalho.
Faço por isso objecção de consciência a todos os que, ao pegar nas novas modas, como parece estar a tornar-se a da felicidade no trabalho, ao inteligentemente perceberem as vantagens desta nova linguagem, a desvirtualizam e desvitalizam, usando-a para trazer as pessoas de volta à submissão, à intimidação, desta vez com propostas disfarçadas de cordeiro, aumentando a descrença em salvações cada vez mais improváveis.
Se tratamos os trabalhadores como máquinas não fiáveis, das quais desconfiamos, e que são substituíveis e meros objetos de produção; se usamos a intimidação para os levar ao limite, e os privarmos da possibilidade de exercer as suas competências e de se educarem e formarem melhor, enquanto lhes negamos a justa e harmoniosa recompensa, entramos em decomposição social, e namoramos o pior do passado e o mais podre da lógica económica: pessoas e locais frios, calculistas e degradantes. Ficamos perante uma nova variação corporativa da dominação, especialmente arrepiante na semana em que celebramos 40 anos do 25 de Abril, que nos permitiu sonhar sermos juntos capazes de práticas democráticas e de uma cidadania resplandecente, com responsabilidade e vigilância.
A felicidade não pode ser o novo endoutrinamento, mais uma floresta do efémero, que seduz pelo superficial, corroendo o vital, uma cortina que esconde o pior do velho império; não pode ser o riso falso ou demoníaco que eclipsa a respeitabilidade ou esconde falsas razões, nem uma proposta que corteja a injustiça. Não podemos nunca permitir as atuais desvertebrações dos trabalhadores para manterem o trabalho, nem novas escravidões, novos medos, novos silêncios, novas censuras, criados pela insegurança e vulnerabilidade social, em nenhum local onde se trabalhe, mas ainda mais em espaços de trabalho onde se fala da importância da felicidade dos empregados. Não podemos ceder às graves e mentirosas inconsistências.
Há semanas, um aluno-trabalhador partilhava connosco numa aula que no seu emprego era proibido falar sobre quanto cada um ganha; se o fizerem, a punição será o despedimento. Algo está profundamente mal quando há temas tabus, que impedem a comunicação, aumentam a desconfiança e limitam a profundidade e espontaneidade das relações. Por isso, apoio o desligar emocional, tal como o propõe Robert Sutton, quando os ambientes laborais são tóxicos, desligar que deverá substituir o convite a outras modas como a mindfulness ou a imaginação positiva/daydreaming, que excelentes em si mesmos, poderão levar a abismos dogmatizantes se o contexto for maléfico e houver elevadas quotas de frustração e indignidade coletivas.  Aí, não deverá haver lugar a elevado comprometimento nem paixão ao que se faz, nem a alegria imposta ou sorrisos obrigatórios e hipócritas, mas sim a formas múltiplas e lúcidas de critica e mudança.
Precisamos de felicidades comprometidas e eloquentes, que levem as vidas dos trabalhadores a correrem como seda, que permitam transgressões ao mal e conjunturas de diálogo, e que se promovam e elevem meramente quando os contextos e as lideranças são equitativas, íntegras, benevolentes e virtuosas.
Como dizia o filosofo russo Pyotr Chaadayev, “Não aprendi a amar a minha pátria com os olhos vendados e a cabeça inclinada.” Não aprenderemos a amar o trabalho e a dedicar-nos a ele de forma verdadeiramente produtiva se nos quiserem de joelhos, silenciados, surdos e cegos, e insensíveis ao fedor do mal. Como investigadora da felicidade, tenho a obrigação também de ser parte da consciência intelectual; e o dever do intelectual, esse luxo dos dias de hoje, é – dizia-o o sociólogo Stanislaw Ossowski já nos anos 1960, pensar de uma maneira desobediente perante os cataclismos civis.
Não deixarei de lutar pela felicidade publica. É talvez uma meta de vida. Mas ou a felicidade rima com dignidade, ou é uma ópera bufa."
Helena Marujo é professora universitária no ISCSP/UL. A autora escreve ao abrigo do acordo ortográfico.
Leituras:
Skidelsky, R. (2014). The programmed pospect before us, The New Your Review of Books, n. 23, 3 de Abril, pp. 35-37.

Sutton, R. (2007). The No Asshole Rule: Building a Civilized Workplace and Surviving One That Isn't. New York: Warner Business Books.