sexta-feira, 5 de julho de 2013

Os bebés e a crise



CARLOS FUGAS - Psicólogo clínico, criador da Terapia Sintónica, no seu artigo do Jornal Publico de 4.7.13:

"O que é a crise para os bebés? Como para eles o mundo é um lugar desconhecido, onde apenas o objeto materno tem significado, podemos dizer que a "crise" do bebé começa e acaba com a ausência e presença da mãe.
As ações da mãe acalmam o bebé, o que permite manter o stress interno baixo, mas então o que acontece na ausência da mãe (ou de quem na sua falta exerce de facto o papel)?
Aqui é que os bebés são mesmo eficientes e dão um bigode aos gestores da crise. O que eles fazem é uma combinação de duas ações complementares, fragmentam o objeto materno dividindo-o em partes e depois ligam essas partes a tudo o que veem.
Explicando melhor, se o bebé vê uma tia materna e se esta tem as orelhas parecidas com as da mãe, ou o nariz, ele liga esse aspeto do objeto materno ao que vê no momento e isso acalma-o, isto é, baixa o stress interno que ameaçava subir com a ausência da mãe.
Acabámos de expor os dois mecanismos básicos da criatividade, decompor objetos complexos nas suas partes e depois ligá-las entre si ou a outros elementos de uma maneira diferente.
As crianças autistas conseguem realizar até à exaustão um destes processos complexos, fragmentando o que veem fora delas, de forma exaustiva. Pode-se até dizer que "microscopicam" a vida, realizando proezas na parcelarização do mundo, ou pelo menos de partes dele. Infelizmente, não são capazes de ligar os elementos de forma diferente, não completando o processo criativo, possivelmente, porque sendo a criatividade uma parte do ego, este no autismo não arranca das "boxes".
A gestão de qualquer crise implica uma boa dose de criatividade, analisando o objeto de estudo, fragmentando-o e ligando os elementos de uma forma diferente. As soluções diminuem o stress quando são bem-sucedidas.
Em Portugal, passa-se muito tempo a analisar (fragmentar) a crise, num exercício de expiação e culpabilização de alguns, numa eterna procura de bodes expiatórios. Estes defendem-se como podem e vão ardendo em lume brando nas fogueiras da opinião pública.
Temendo ser criativos, ou vivendo ainda à sombra da criatividade dos nossos antepassados, os nossos líderes, quase todos se vão arrebanhando às tutelas europeias, isto é à dependência dos outros. Resumindo, alguém tem de tomar conta de nós, o que infelizmente só nos enfraquece. Aqui e ali, uma experiência ou voz dissonantes, como a de um autarca do Porto que diminuiu um imposto importante e equilibrou as contas, lembram-nos a todos que a única fatalidade na vida é a posteridade.
Lentamente os bebés libertam-se da absoluta dependência das mães para manterem o stress interno a níveis aceitáveis, seguem em frente, são criativos e como crianças já exploram o mundo. Não nos esqueçamos nós, adultos, dos passos que já fomos capazes de dar."

Curriculo do Drº Carlos Fugas
Concluiu a licenciatura em Psicologia no ano de 1983, pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto.; Concluiu com aproveitamento, em 1991, o Curso de Formação de Terapeutas da Sociedade Portuguesa de Terapia Familiar, sendo actualmente Terapeuta Familiar; Concluiu a formação como director de psicodrama psicanalítico de grupo em 2001.
É assessor da Carreira Técnica Superior de Saúde, na Equipa de Tratamento de Sintra do I.D.T.; Deslocou-se em Julho de 2006 aos E.U.A., Boston, onde frequentou um Curso de Introdução à P.B.S.P. com Albert Pesso. Foi organizador do 1º Curso de Formação de Terapeutas em P.B.S.P. em Portugal, a partir de 2007. Desempenha actualmente a função de Director Clínico do Programa "Lugar da Manhã", em Setúbal, do qual foi um dos fundadores em 1991.



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