Entrevista
de Ana Dias Cordeiro à psicóloga Diana Silva que saiu no Jornal Publico a 6 de Agosto de 2017,
com o título "É muito importante intervir e ajudar estes jovens
agressores":
"Quadros de ansiedade e de depressão estão muitas vezes presentes entre os
adolescentes violentos, diz investigadora
A investigadora Diana Silva é também uma das autoras do livro Intervenção
psicológica com jovens agressores da editora Pactor — Edições de Ciências
Sociais, Forenses e da Educação — com publicação prevista para
Setembro. Nesta entrevista, a psicóloga fala de violência
juvenil, sem comentar casos particulares.
PÚBLICO – Os casos mediáticos são apenas uma pequena parte dos episódios violentos em
ambiente escolar?
Diana Silva – Há uma parte muito pequena que é denunciada e ainda menor é a parte
das que são denunciadas através de vídeos e que acabam nas redes sociais. Os
investigadores dizem que apenas cerca de metade dos casos são
denunciados. Este é um fenómeno transversal a todas as escolas – sejam
públicas, sem privadas, sejam alunos de estatuto socioeconómico mais elevado ou
mais baixo. Situações de violência acontecem todos os dias, em todas
as escolas e sempre aconteceram em contexto escolar desde que existe a escola.
Quando há agressividade física, e quando há danos físicos, é mais fácil que a
situação seja denunciada.
Habitualmente as vítimas
não denunciam por medo? Por vergonha?
Por sentimentos de vergonha, de inferioridade, por acharem que não vão ser
ouvidas. As próprias vítimas entram depois em autocrítica, pensando ‘eu
devia ter-me imposto, devia ter feito alguma coisa, eu não admito que isto
aconteça’. Porém, quando estão efectivamente na situação, não conseguem ter
essa postura e muitas vezes criticam-se por não denunciarem e não conseguirem
sair da situação. Isso acaba muitas vezes num ciclo que gera ainda mais
vergonha. Continuam a questionar-se: ‘Como é que fui capaz de me submeter a uma
situação daquelas sem me defender?’
Os vídeos denunciam os
suspeitos. Porque são então as imagens partilhadas na Internet?
Pode ser com o objectivo de perpetuar o ciclo de humilhação do outro ou para
tentar ganhar estatuto entre o grupo – partilham e dizem ‘fui eu que partilhei
esta situação onde eu estava realmente a ser dominante perante alguém’ – sem
terem aquele insight de
que esta é uma situação que para os próprios também é humilhante. As partilhas
resultam em comentários hostis, e estes reforçam sentimentos que eles próprios
já tinham – tanto a vítima como o agressor.
O agressor também tem
sentimentos de inferioridade?
Sim, e o facto de repetidamente isto aparecer nas redes sociais com os
comentários hostis vai ao sabor destas ideias que eles já têm sobre si mesmos.
Uns têm consciência desse sentimento de inferioridade, aceitam-no e debatem-se
constantemente com isso. Outros tentam negá-lo, e exteriorizá-lo nos outros.
Enquanto alguns jovens interiorizam isso, acham mesmo que são inferiores, fogem
das situações sociais, sofrem de ansiedade social ou acabam mesmo por ficar deprimidos,
outros adolescentes não querem conviver com esse sentimento de vergonha. Tentam
culpar o outro, e atacam o outro, mas o sentimento está lá na mesma. Esta é uma
mensagem muito importante. Uma criança que está bem não tem necessidade de
estar a fazer isso.
As vítimas têm que ser
claramente ajudadas, mas os jovens com este comportamento agressivo
também dão um sinal de dificuldades. Assim como existem quadros de
ansiedade e quadros de depressão, existe também uma patologia de comportamento
que é mesmo uma patologia e indica um nível de sofrimento. É muito
importante intervir e ajudar estes jovens agressores. Ajudar os dois
lados.
É mais difícil ultrapassar
o estigma, quando a situação é exposta na Internet?
Este tipo de exposição poderá entrar quase como um evento traumático, do lado
da vítima porque é uma situação em que ela está a ser humilhada ou maltratada,
e do lado do agressor porque é uma situação em que, da mesma forma, acaba por
ter o mesmo impacto, o mesmo estigma, a mesma humilhação (por ter participado
naquilo).
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