Eduardo Sá no minuto 1,55
Artigo de Clara Viana que
saiu no Publico a 30.1.2006, com o título "As
escolas estão a tornar-se "desonestas" e "batoteiras",
acusa psicólogo:
"Eduardo Sá defendeu a existência de exames nacionais e considerou que
"mau é mudar as regras a meio do jogo", como fez o actual ministro da
Educação, ao anunciar, este mês, que aquelas provas já não se realizavam este
ano lectivo.
Foi um retrato impiedoso para as escolas
e para o sistema educativo o que o psicólogo Eduardo Sá traçou esta sexta-feira
numa conferência promovida pelo Instituto de Avaliação Educativa (Iave), o
organismo responsável pela elaboração e aplicação dos exames nacionais, que
teve como tema Avaliar para aprender. “Uma
escola que acha que tem de avaliar, embrulhando os testes e os exames num clima
de alarme, é uma escola que diz às crianças que o importante é ter bons
resultados e não aprender (…) E uma escola assim é desonesta”, comentou este
especialista em psicologia da criança e do adolescente, lembrando que muitos
alunos são afastados das escolas onde estão precisamente devido à sede destas
em garantirem bons resultados nos exames nacionais.
Para o psicólogo e psicanalista, temos
nas escolas de hoje “turmas de primeira e de segunda, disciplinas de primeira e
de segunda, alunos de primeira e alunos de segunda”. “São formas estranhas com
que temos convivido e que já mereceram aval ministerial. Mas uma escola assim
transforma-se numa escola amiga do apartheid e uma escola assim avalia, mas não
educa”, criticou.
Eduardo Sá, autor de livros como Queremos
Melhores Pais! e Hoje
Não Vou à Escola!, não
se ficou por aqui. Disse que as escolas e as famílias são também “batoteiras”
nas avaliações que fazem das crianças porque não lhes dão “o direito de errar”.
“É estranho que não se acarinhe o erro, porque uma criança que não pode
livremente errar ganha uma imunodeficiência adquirida ao erro e à dor”. O que
tem como consequência, advertiu, “tornarem-se competitivos e presunçosos,
quando diante do conhecimento deviam ser rebeldes”. “Crianças assim pensam
pior”, acrescentou.
A favor dos exames
Quer isto dizer que Eduardo Sá é contra
a avaliação e os exames? A resposta é negativa e tem como alvo o actual
ministro da Educação, que no início do mês anunciou que, já este ano lectivo,
não se realizarão exames no 4.º e 6.º ano por considerar que estes têm efeitos
“nocivos” para as crianças. “Se as crianças não aprendem a conviver com o medo
de serem avaliadas ficam mais frágeis, com menos garra e menos brio”, comentou
o psicólogo, acrescentando que “não é mau que destilem medo face aos exames,
porque o medo traz também audácia”.
“Mau é mudar as regras a meio do
jogo. Mau é discutirmos as avaliações antes das aprendizagens”, acusou, antes
de afirmar o contrário do que foi dito pelo ministro Tiago Brandão Rodrigues.
“Quanto mais tarde as crianças tiverem provas nacionais, mais tarde reúnem os
recursos para as vencer”, disse Eduardo Sá. Antes já tinha frisado que “os
exames não magoam as crianças, o que as magoa é a forma como os pais e as
escolas acabam por usar” esta avaliação.
Todo um conjunto de razões que levaram
este especialista a considerar que o tema da conferência do Iave deveria ser
invertido: em vez de Avaliar para aprender “devíamos assumir que tem de se
Aprender para avaliar”. “Será que a escola que avalia reconhece os seus
erros?”, questionou a propósito, com a resposta já pronta: “Raramente”. Eduardo
Sá considerou ainda que a educação “tem sido objecto de uma tremenda demagogia
política” e estranhou que nenhum dos candidatos presidenciais se tivesse
proposto promover “um pacto para a educação para 20 anos”.
O tempo dos professores
Antes, Gordon Stobart, professor do Institute of Education, University College London, alertara que as formas de aprender necessárias no século XXI “não são compatíveis com o modelo de exames que se impôs no Reino Unido e nos EUA”. “Temos fechado centenas de escolas por ano por não terem conseguido bons resultados nos exames nacionais. Não nos importamos sobre qual o tipo de cidadãos vamos ter, mas apenas com os resultados dos exames”, acusou.
Antes, Gordon Stobart, professor do Institute of Education, University College London, alertara que as formas de aprender necessárias no século XXI “não são compatíveis com o modelo de exames que se impôs no Reino Unido e nos EUA”. “Temos fechado centenas de escolas por ano por não terem conseguido bons resultados nos exames nacionais. Não nos importamos sobre qual o tipo de cidadãos vamos ter, mas apenas com os resultados dos exames”, acusou.
Mas Gordon Stobart também não poupou a
“pedagogia” que se tornou predominante nas escolas. Com base num inquérito
realizado no Reino Unido, resumiu assim o que acontece nas salas de aula: “os
professores falam 70% a 80% do tempo; fazem 200 a 300 perguntas por dia; 60% do
seu tempo é passado a rever a matéria e 20% em procedimentos – onde puseste o
lápis? O que fizeste ao caderno? –; e só menos de 5% é dedicado à discussão em
grupo de ideias com significado, o que é assustador porque esta é uma forma
poderosa de aprender”. Não por acaso, o professor inglês acrescentou ainda mais
este retrato – “70% das respostas dos alunos duram menos de cinco
segundos e resumem-se a isto: Não sei”.
Aos professores presentes na
conferência, Gordon Stobart perguntou se sabiam qual a razão da popularidade
dos programas de culinária. “É que precisamos de ver antes de fazer. É o que se
passa também nas salas de aula”, disse. "
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